segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Julgamentos Pitorescos

Um estudo dos direitos fundamentais pode abranger os mais variados assuntos. Quase sempre, a discussão é bastante séria, envolvendo situações dramáticas que afetam valores fundamentais para o ser humano, como a vida, a liberdade, a igualdade. Imagine temas como o aborto, a eutanásia, o racismo, a luta contra a tortura etc...
Mas às vezes surgem alguns casos pitorescos que nos permitem dar boas risadas. Veja bem: não estou dizendo que esses casos não merecem ser levados a sério. Pelo contrário. O que quero dizer é que são situações curiosas, engraçadas até. Um prato cheio para os professores de direitos fundamentais animarem suas aulas.

O Caso Daniella Cicarelli
Era uma bela tarde de sol na praia de Tarifa, em Cádiz, na Espanha. Ótimo dia para curtir uma praia, especialmente em boa companhia. Foi nesse cenário que a modelo Daniella Cicarelli e seu namorado, Tato Malzoni, protagonizaram um dos mais polêmicos casos jurídicos ocorridos no Brasil, para deleite dos professores de direito.
Inicialmente, parecia um dia normal de praia. Água de coco, picolé e areia. Ocorre que o clima entre os dois namorados foi ficando cada vez mais quente (ou melhor, caliente) e, no calor do momento, não resistiram à tentação. As carícias foram ficando cada vez mais desinibidas, até que os dois decidiram extravasar seus sentimentos no mar, onde provavelmente teriam mais intimidade.
Mal sabiam eles, porém, que os abraços (e algumas carícias a mais) estavam sendo observados por um paparazzo, que filmou tudo à distância. O vídeo foi exibido por um canal pago de televisão na Espanha e, rapidamente, espalhou-se pela Internet, transformando-se em um sucesso mundial.
A modelo e seu namorado, tentando evitar a divulgação do vídeo, ingressaram com ação judicial, no Brasil, contra alguns portais eletrônicos que estavam disponibilizando gratuitamente o arquivo digital para seus usuários, como os sites Ig, Globo.com e YouTube.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), analisando um recurso do casal, concedeu medida liminar (antecipação de tutela) para proibir a divulgação do vídeo.
O julgado recebeu a seguinte ementa:
“Pedido de antecipação de sentença por violação do direito à imagem, privacidade, intimidade e honra de pessoas fotografadas e filmadas em posições amorosas em areia e mar espanhóis – Tutela inibitória que se revela adequada para fazer cessar a exposição dos filmes e fotografias em web-sites, por ser verossímil a presunção de falta de consentimento para a publicação [art. 273, do CPC] – Interpretação do art. 461, do CPC e 12 e 21, do CC – Provimento, com cominação de multa diária de R$ 250.000,00, para inibir transgressão ao comando de abstenção” (TJSP, Agravo de Instrumento 472.738-4, rel. Ênio Zuliane, j. 28/9/2006).

A meu ver, ao proibir a divulgação do filme, a decisão judicial limitou excessivamente um direito fundamental (a saber: liberdade de imprensa e o direito à informação) em favor de um interesse pessoal de uma celebridade que sabia perfeitamente que poderia ser filmada ou fotografada em um local público.

O juiz da causa, Gustavo Santini Teodoro, que analisou o feito em primeiro grau, julgou contra a modelo e seu namorado, entendendo que não teria havido violação à privacidade ou à intimidade, já que se tratava de local pública.

Ainda assim, o TJSP manteve liminarmente a proibição do vídeo, mas o mérito do recurso ainda não foi julgado até o momento.

Apesar da proibição, o certo é que qualquer pessoa, com o mínimo de conhecimento de internet, consegue obter cópia do vídeo em sites ou programas de compartilhamento. Nesse aspecto, a tecnologia está atropelando o direito.

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