terça-feira, 21 de agosto de 2007

Julgamentos Pitorescos

Um estudo dos direitos fundamentais pode abranger os mais variados assuntos. Quase sempre, a discussão é bastante séria, envolvendo situações dramáticas que afetam valores fundamentais para o ser humano, como a vida, a liberdade, a igualdade. Imagine temas como o aborto, a eutanásia, o racismo, a luta contra a tortura etc...
Mas às vezes surgem alguns casos pitorescos que nos permitem dar boas risadas. Veja bem: não estou dizendo que esses casos não merecem ser levados a sério. Pelo contrário. O que quero dizer é que são situações curiosas, engraçadas até. Um prato cheio para os professores de direitos fundamentais animarem suas aulas.

Caso Gerald Thomas

Foto extraída do site do próprio Gerald Thomas. No final das contas, o STF julgou favoravelmente ao diretor de teatro, decidindo que o seu comportamento de mostrar a bunda e se masturbar em público estaria protegido pelo direito fundamental à liberdade de expressão.

Este caso ocorreu no Brasil e gerou certa polêmica na época.
Para quem não se lembra aqui vai: Gerald Thomas é um famoso diretor de teatro brasileiro, cujas peças teatrais são conhecidas pelas polêmicas que provocam.
No dia 17 de agosto de 2003, às duas horas da madrugada, Gerald Thomas concluiu a apresentação de mais uma peça – uma adaptação de “Tristão e Isolda” – , que dirigiu no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Ao invés de ouvir os tradicionais aplausos, Gerald Thomas foi vaiado pelo público, que não havia gostado da peça.
Como forma de protesto pelas vaias que recebia, o diretor de teatro simulou uma masturbação no palco e, ato contínuo, virou de costas para o público, abaixou as calças até o joelho, arriou a cueca e exibiu suas nádegas para os espectadores que ali se encontravam. A lamentável cena foi, inclusive, filmada, tendo gerado ampla repercussão após ser divulgada em cadeia nacional por diversas redes de televisão.
O caso foi parar na polícia. Gerald Thomas foi acusado da prática de “ato obsceno”, crime tipificado no art. 233 Código Penal brasileiro: “praticar ato obsceno em público ou aberto ou exposto ao público: pena, de detenção de três meses a um ano, ou multa”.
Não conseguindo barrar o trâmite da ação penal nas instâncias ordinárias, Gerald Thomas ingressou com pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal, alegando que a perseguição penal violava o seu direito à liberdade artística e de expressão.
O Supremo Tribunal Federal, após longa discussão, concedeu o referido habeas corpus, por decisão empatada, entendendo que o ato do diretor de teatro estaria inserido no contexto da liberdade de expressão, “ainda que inadequada e deseducada”.
Eis a ementa do acórdão:
“Ementa: Habeas corpus. Ato obsceno (art. 233 do Código Penal). 3. Simulação de masturbação e exibição de nádegas, após término de peça teatral, em reação a vaias do público. Não se pode olvidar o contexto em que se verificou o ato incriminado. O exame objetivo do caso concreto demonstra que a discussão está integralmente inserida no contexto da liberdade de expressão, ainda que inadequada e deseducada. 4. A sociedade moderna dispõe de mecanismos próprios e adequados, como a própria crítica, para esse tipo de situação, dispensando-se o enquadramento penal. 5. Empate na decisão. Deferimento da ordem para trancar a ação penal. Ressalva dos votos dos Ministros Carlos Velloso e Ellen Gracie, que defendiam que a questão não pode ser resolvida na estreita via do habeas corpus” (HC 83996-RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 17/8/2004).

Nenhum comentário: